Carta a La Loba

sábado, 1 de junho de 2019


Prezada Loba,

Por que é sempre tão solitária e muda?

Por que se esconde?

É como se sempre estivesse presente, mas, apenas algumas vezes, revelasse a sua voz, por meio do canto lírico, como o canto de uma sereia, doce e poderoso, que ecoa à distância. Você revela a sua presença por meio de cantos e gemidos.

Será que é isso? Será que você é meu coração e o ar de meus pulmões, que inspiram, expiram e bombeia vida?

Eu te sinto no prazer... No prazer de criar... Fazer arte e criar amor...

Te sinto na reflexão e nas respostas sábias, como uma velha que diz, docemente e com sua voz enrugada de avó: "respire e relaxe. Dói, mas já passei por isso e sei que vai passar."

Se é assim, por que se cala diante da dor?

Onde você esteve em todo esse vale de lágrimas que percorri e derramei por pessoas que acham que te entendem, mas não entendem? Nem eu te entendo e, ao mesmo tempo, sim.

Estou confusa.

Será que, às vezes, não te sinto porque somos uma só e ou estamos muito conectadas, a ponto de não nos diferenciarmos mais ou muito desconectadas, pelas modernidades e intelectualizações que fazem parte da vida?

Sinto que ambas as coisas estão corretas e, às vezes, é difícil dar forma à dicotomia... Ao paradoxo... Ao contraste e ao controverso... Mesmo que essa forma seja feita de palavras...

Talvez seja por isso que seja água: você se molda de acordo com o meio em que é inserida e talvez por isso, seja tão difícil te definir...

Sei que te busco, mesmo sem bússola, nem rumo...

Uma rosa-dos-ventos, da água, do fogo e da terra, que paira no limbo do meu eu...

É presente, passado e futuro, longínquos ou no atual momento, que já ficou obsoleto, pois já escrevi e a cada palavra que escrevo, registro um passado recente e a cada palavra que penso em escrever, me pergunto "o que mais eu vou inventar? O que mais preciso te/nos dizer?"

Sei que te escrever me dá alívio... O alívio de parir...

Loba solitária, forte, presente, solidária, meiga e guerreira, te venero e admiro e anseio me apropriar de ti, cada vez mais, e de teu poder, pois somos uma só e te buscar, te encontrar, te acolher e te perceber são missões para a vida inteira e o alcance desse inteiro é um meio que essa vida fracionada faz para se completar.


(Daliana Medeiros Cavalcanti - 01/06/2019)