Entre crises e respiros

terça-feira, 1 de agosto de 2023




(Daliana Cavalcanti – 01/08/2023)


Entre o final de junho e início de julho, fui para Vitória/ES, para participar de um Ópera Estúdio e estava muito feliz e empolgada com a oportunidade, afinal de contas, fazia anos que não participava de um: o último Ópera Estúdio que participei foi em 2016, em Recife/PE que, infelizmente, teve sua última edição naquele ano, devido ao constante corte de recursos para realizar o projeto, o que é muito triste para o cenário operístico do Nordeste, que já conta com pouquíssimas oportunidades.

Ópera Estúdios são cursos voltados para a profissionalização de cantoras(es) de ópera e, geralmente, são duas semanas intensas, que contam com aulas de canto, masterclasses, aulas de vários outros assuntos, como dicção lírica, aulas de atuação, etc. Como podem perceber, é um curso “bem puxado”, que começa pela manhã, temos intervalo para o almoço, voltamos à tarde e, normalmente, termina de umas 18h. À noite, é o período em que voltamos para casa e alternamos o estudo do que aprendemos com um pouco de descanso. É uma rotina cansativa, mas muito rica em trocas e conhecimentos e isso compensa todo o cansaço para qualquer cantor(a) que, assim como eu, AMA aprender e se desenvolver.


Eu sabia que estava fazendo uma “maluquice” ao querer fazer esse curso, pois eu estava em fase de finalização de um projeto de pesquisa, ou seja, TRABALHO, que era minha prioridade, entretanto, como expliquei acima, existem poucas oportunidades de participar de um curso desses aqui no Nordeste, então, ao saber da realização deste, “agarrei a chance” e me arrisquei.

Finais de projetos sempre são muito conturbados e deixa todos os envolvidos nervosos e estressados, como explicado anteriormente, os Ópera Estúdios também têm uma rotina muito “pesada”, então, estava uma “pilha de nervos”, pois queria “dar conta” de ambas as atividades.


Em meu estado “normal”, acho que conseguiria administrar as tarefas, o emocional e o cansaço, mas o próprio cotidiano da vida me deixa num estado de profunda exaustão e creio que isso deva ter baixado minha imunidade. Então, após visitar um ponto turístico de Vitória (o Convento da Penha), nas raras vezes em que saí para me divertir, tive dores na coluna, de tanto subir escadas (e, além de estar cansada, o fato ser muito sedentária contribuiu com a piora da situação) e contraí alguma infecção viral que depois, virou uma infecção bacteriana, mas isso só foi diagnosticado depois! 

O primeiro diagnóstico que tive, tanto online, quanto na UPA, foi de crise de depressão e ansiedade, pois me sentia muito fraca para completar as tarefas que me propus a fazer e, ao mesmo tempo, queria muito concluí-las porque ODEIO irresponsabilidade e, mais ainda, ODEIO me sentir irresponsável.


Eu nunca tive tanta doença junta e nunca tive uma crise tão forte quanto essa: quanto à ansiedade, eu tinha ânsia de vômito e mesmo com pouco apetite, me forçava a comer, para ter forças para enfrentar o dia e, inicialmente, só vomitava água, mas depois, comecei a colocar para fora tudo o que ingeria e, quanto à depressão, durante vários momentos, eu não conseguia me levantar da cama para realizar as tarefas cotidianas mais simples, como tomar banho, escovar os dentes, comer e beber água. Só depois de muito tempo deitada é que eu conseguia juntar as poucas forças que tinha para realizar algumas dessas tarefas, não todas.

Durante esse período, eu me senti péssima: indefesa como um bebê, dependente de tudo e de todos e, ao mesmo tempo, tinha uma enorme raiva de mim mesma, por não conseguir atingir os principais objetivos de cantar e finalizar a pesquisa. Se não fosse minha amiga Mayssára e minha irmã Daniella, não sei o que seria de mim, pois me senti uma completa inútil e não consegui fazer nada REALMENTE. Gratidão às duas. 💓



O sentimento de frustração foi uma constante nesse período, porque eu tenho uma auto-cobrança muito forte e tudo o que eu faço, mesmo a menor das atividades, eu gosto de fazer com excelência e com alto padrão de qualidade. Eu me exijo muito e tenho consciência que isso é uma autossabotagem terrível e que tento melhorar em mim, sendo mais gentil comigo mesma, mas sou humana... Não é sempre que consigo ter esse auto-amor...

Queria ter concluído o projeto da melhor forma possível, sem prejudicar o andamento da pesquisa... Queria ter sido uma melhor hóspede... Queria ter sido uma melhor amiga... Queria ter conhecido mais de Vitória e das cidades próximas... Queria ter sido mais forte... Queria ter cantado na ópera, ao final... Queria ter mostrado tudo o que sei fazer para a maravilhosa equipe de professores do Ópera Estúdio, ainda mais depois deles terem gostado da minha voz, da minha dicção do inglês britânico e da familiaridade maior que tenho com o teatro (que tenho lutado para conquistar)... Queria ter feito muita coisa e não consegui, porque além de ter adoecido com as infecções, eu mesma, meu emocional e minha auto-cobrança me sabotaram e me impediram de alcançar meus objetivos...

Estava tão enlouquecida de preocupação em atingir essas metas, que um rapaz bonito até demonstrou interesse em mim e mesmo sendo um homem muito interessante, eu não tive o menor “clima” e cabeça para namorar, então, eu me sabotei até mesmo nisso!


 “Ok, Dali. Por que você está contando tudo isso?”

A intenção não é “me fazer de coitadinha” e sim, de escrever mais um texto para conscientizar sobre a depressão e a ansiedade, uma vez que tenho um quadro misto dessas duas doenças. Eu JURO que nunca tive uma crise tão forte e terrível como essa e não desejo isso para ninguém!

É importante escrever esses textos, pois além de desabafar um pouco, as pessoas tomam conhecimento do assunto e isso é muito importante para que elas evitem falar besteiras como “depressão é falta de Deus”, “você está tomando remédio porque quer”, “você não tem depressão”... Depressão é uma DOENÇA! Um desequilíbrio químico do cérebro, que desregula os neurotransmissores, como a serotonina, noradrenalina, dopamina, entre outros e isso só consegue ser regulado com REMÉDIO, portanto, não é uma “escolha”, a menos que você opte por não se tratar e/ou não melhorar, o que é um risco enorme à própria VIDA.

Aliada à medicação, TEM que fazer terapia para saber quais as causas psicológicas que desencadearam a doença, portanto, não se trata depressão só com remédio, nem só com terapia: tem que ser os dois JUNTOS.



Quanto às pessoas que “acham que não tenho depressão” ou “não pareço ter”, eu tenho ciência que existem alguns médicos costumam prescrever remédio sem necessidade, porque eles também lucram com isso, mas acho que não é o caso. Por que, então, há anos atrás, quando fui diagnosticada, eu chorava quase todos os dias? Que eu saiba, eu não pretendia fazer nenhum teste de elenco para a nova Maria do Bairro! Por que eu não consegui me levantar da cama durante esse período em Vitória, que se estendeu, até mesmo, quando voltei à Natal? Preguiça? E que “preguiça” é essa em que a pessoa não se sente bem, não relaxa/descansa e não consegue nem comer? E bom... Sem comentários quanto às pessoas que acham que “é falta de Deus”. Aí sim, sinto preguiça de argumentar!

Eu estava tão abatida, que lembro de, no aeroporto, na viagem de volta para Natal, ter ido ao banheiro, me olhado no espelho e não reconheci a pessoa no reflexo... Não parecia eu! Parecia um outro alguém, que não sei bem quem é, mas que estava ali, devolvendo o olhar, no lugar onde deveria estar a minha imagem...


Quando voltei para Natal, mais uma vez, me vi sem condições de fazer nada, vomitando até a água que tomava e pedi ajuda à minha irmã. Foi quando ela me levou para o hospital e aí, foram diagnosticadas as infecções viral e bacteriana, que tratei e, atualmente, me curei.

As crises também cessaram e passei boa parte das semanas tomando remédio, me cuidando e, principalmente, DESCANSANDO! E nossa... Como eu precisava desse descanso! Acho que a falta dele foi outro dos principais motivos de eu ter adoecido tanto.

A infecção me derrubou bastante, mas as crises... Nossa! Durante o período de recuperação, por mais bobo que pareça, cada pequena ação, era uma vitória: quando consegui ter forças para me levantar e tomar banho... Escovar os dentes... Quando consegui voltar a comer, sem colocar a comida para fora! Quando pude voltar a beber água normalmente, sem vomitar... Quando, enfim, aos poucos, fui “voltando a ser eu” e voltando a me cuidar.


Parece uma bobagem, principalmente, porque estamos acostumades a desempenhar todas essas ações, sem problema algum, mas ter voltado a fazer tudo isso me fez pensar em como as pequenas atividades do dia-a-dia são importantes para nossa vida e o quanto é bom poder fazê-las sem problemas. Foi aquele famoso caso de “precisamos perder as coisas/pessoas para dar valor a elas”. Então, eu comemorava, sozinha, cada pequena conquista, de cada atividade cotidiana que fazia com que voltasse a ser eu mesma.

Depois do “baque” de tantas doenças juntas num só ser humano, tive uma sensação de renascimento e percebi que preciso mudar meu estilo de vida. Meu sedentarismo, exaustão/falta de descanso e minha forte auto-cobrança foram fatais! Foram tiros que dei em meus próprios pés e para não reviver todas as sensações horríveis que tive, senti que precisava mudar.


E bom... Que melhor momento para renascer, senão o período do aniversário? Em breve, completarei mais um ano de vida e espero poder viver o suficiente para realizar meus sonhos e, mais ainda, de ser um ser humano mais consciente e melhor a cada dia.

Não sejam que nem a teimosa aqui, que vos escreve, para mudar, gente, que teve que ter um baque violento para se preocupar com a própria saúde: se cuidem e tenham uma vida próspera e feliz.

Existe vida durante as crises e durante as doenças como depressão e ansiedade. Procurem ajuda para se curar e, se não tiver cura, para viver da melhor forma possível.

Sigamos em frente e beijão! 😘😘😘


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