O masculino e a fragilidade

sexta-feira, 12 de agosto de 2016


Como falei sobre o feminino, numa postagem anterior, falarei sobre o masculino.

Muitos podem acham minha opinião suspeita, uma vez que não sou um homem, mas falarei deste assunto na minha visão feminina, de alguém que teve muitos amigos do sexo masculino, trocou muitas ideias com eles e falarei sob meu ponto de vista, obviamente. Sintam-se à vontade para discutir o assunto.

Obs.: claro que cada homem é único e tem muitos que fogem a essas regras e já desconstruíram muitos padrões, mas fica a reflexão sobre o sexo masculino de uma forma bem geral.

Do mesmo jeito que existem muitos estereótipos e muitas construções sociais nas mulheres, existem construções em cima dos homens também e são construções bem distintas.



As pessoas, geralmente, definem o homem como um ser poderoso, de muita força física, com um enorme apetite sexual, o líder, chefe da família, "senhor do seu castelo"... Alguns apelidos podem ser carinhosos e terminar com "inho", algumas vezes  (Paulinho, Joãozinho, Dinho, etc), mas geralmente, tem muito apelido que termina com "ão" (Pedrão, Marcão, Carlão, etc), para enfatizar a grandeza, poder e importância que esta pessoa possui, isso quando os apelidos não são propositalmente pejorativos, para brincar e "tirar onda" uns aos outros (Zé Peidão, Gordo, Narizinho, etc).

É interessante observar, nesse simples exemplo, como os homens sempre ressaltam o melhor de suas características e o quanto eles não sentem a necessidade de se empoderar, pois eles já se sentem empoderados, em sua maioria (sempre existem as exceções). Enquanto os apelidos masculinos pedem "ão", para demonstrar sua grandeza, as mulheres são sempre "inhas", para ressaltar sua fragilidade e/ou carinho. Se uma mulher tem algum apelido de "ão", ou atribuem a ela uma característica masculina (em poucos casos, essa associação ao masculino não ocorre). Um homem com apelido de "inho" é apenas um homem com apelido carinhoso. A inversão de valores de atribuir o "inho" a uma característica feminina já não é tão frequente.

Enquanto as mulheres lutam para tornarem-se a definição do que é ser mulher que a mídia vende, longe de seus padrões naturais, o homem já não sente tanto essa necessidade. O homem tem a liberdade de escolher se ele quer deixar o cabelo longo ou não... Se quer usar barba ou não... Se ele vai se depilar ou não...

Claro que sempre existirão os conservadores que dizem que homem tem que ter cabelo curto e ter os pelos naturais, nem pode usar brinco, mas isso tem melhorado muito com o passar do tempo e, hoje, os homens têm mais liberdade de escolha em relação aos seus pelos e outros acessórios. Outro avanço masculino diz respeito à moda. Até uns anos atrás, rosa e roxo eram "cores de viado"... Roupa colada também... E hoje, vemos vestimentas mais variadas para os homens e calças e ternos skinny. Cortes de cabelo mais diversificados...

Alguns de vocês podem estar se dizendo "mas Dali, esse post é sobre 'o masculino e a fragilidade'. Onde está a fragilidade nessa história?", ou ainda "lá vai a feminista que acha que tudo na vida do homem é um mar de rosas". Para a primeira pergunta, chegarei lá em breve e para a segunda, não. Ser homem também não é fácil.

O que eu sinto, como mulher e em relação ao feminismo é que nós buscamos identidade... Cada vez mais, estamos nos questionando o que é o feminino... O que é construção social... Como nos sentimos melhor... Como sou eu, como mulher e como me coloco diante do mundo... O homem, não. O homem não se questiona em relação ao machismo: eles têm certeza. Eles sabem o que é ser homem e são ensinados a ser assim desde sempre. O que eles buscam é afirmação.

Esta afirmação funciona da seguinte forma: não basta eles, simplesmente, nascerem homens. Eles têm que mostrar que são homens. Têm que mostrar o quanto são fortes. O quanto eles são os provedores do seu lar. O quanto são poderosos. O quanto eles "pegam todas". O poder sexual que eles têm. Eles tentam afirmar, o tempo todo, algo que é óbvio e que não há a necessidade de afirmação.


E é nessa afirmação onde mora toda a fragilidade do homem - na tentativa desesperada de conseguir o respeito de seus amigos e o respeito feminino, eles acabam se prejudicando. Duvidam? Darei alguns exemplos...

Quantas histórias de amigos ou conhecidos vocês (ou essas histórias podem ser, até mesmo, suas) não conhecem que entraram em brigas, durante shows, por motivos tolos? Eles poderiam ter um machucado sério e poderiam até arriscar suas próprias vidas, mas se envolveram em briga para mostrar que é homem e que não leva desaforo para casa.


E histórias de traições? Alguns homens estão tão acostumados a mostrar o quanto são viris e sexuais que mesmo amando suas parceiras, traem, puramente, por essa afirmação "do quanto é homem" e ficam com outras mulheres. Eles colocam um relacionamento estável (e falo da condição de um relacionamento sério e em comum acordo de exclusividade e não de "ficas"), com uma mulher que amavam, em risco por uma construção social que é imposta a eles e poucos são aqueles que param para se questionar isso e tentam mudar. Acaba virando um vício sob a desculpa de "é a testosterona", ou "homem é assim mesmo", ou ainda "homem só pensa com a cabeça de baixo. É a natureza".

E os homens que "têm que sustentar a casa"? Tem homens que não gostam quando a mulher trabalha, pois sentem seu poder de "senhores da casa" ameaçado e, em contrapartida, se esses homens não são ricos, podem ter apertos financeiros, caso proíbam a mulher de trabalhar e chega a ser inacreditável que alguns homens prefiram manter seu orgulho a pedir ajuda... Esse famoso "orgulho de homem" é essa necessidade de afirmação do quanto "é machão, independente e resolve tudo sozinho".

Com isso, meus caros leitores, concluo que o machismo é tão ruim que não serve nem para o próprio homem. Não percebem? Os homens são obrigados a servir o exército aos 18 anos e muitos são não gostariam de servir... Colocaram na cabeça dos homens que eles são os provedores da casa e, algumas vezes, a mulher também pode ajudar financeiramente (e, em contrapartida, o homem ajuda nos afazeres domésticos) e não há vergonha alguma se ela ganhar mais do que o homem, mas por causa do machismo, os homens se sentem diminuídos se a mulher ganha mais...

Se o homem está apaixonado e está em um relacionamento sério, seja por um homem ou uma mulher, por que ceder às provocações dos amigos, para provar que "não é manicaca" (como se estar apaixonado e ser manicaca fosse a mesma coisa. E se vc estiver apaixonado, for manicaca e feliz? E aí? O que os outros têm a ver com isso?)? Ou, ainda, ceder à sua fraca convicção de sua masculinidade, que tem que ser provada a todo o instante? Aliás, se você pretende ficar com outras pessoas, sugiro que não assuma um compromisso com ninguém e que as pessoas com quem você esteja ficando concordem com essas condições. O problema não está em ficar com várias e sim, estar com várias, mentindo que está super-apaixonado por ela, pedindo a fidelidade e exclusividade do(a) parceiro(a) quando você não cumpre com a sua parte do acordo. Aí, já é problemático!

E se você estiver afim de usar rosa-choque? Ou roxo? E se você quiser ser cozinheiro? Ou bailarino? Ou estilista? E se você ama seu(sua) filho(a) e quer ter a guarda dele, para cuidá-lo(a) e educá-lo(a)? E se você não quiser se alistar? E se você quiser "quebrar a munheca"? E se você não quiser sair com alguém? E se você não quiser trair ou quiser se dedicar a uma só pessoa? E se você gostar de pentear o cabelo da sua filha e pintar as unhas dela? E se você não gostar de brigas violentas e desnecessárias? E se você não gostar de beber (tem caras que acham que só é homem quem ingere bebidas alcóolicas. Já presenciei cenas de amigos tirando onda com o outro amigo que não bebe)? E se você gostar de novelas e/ou filmes de romance? Você vai ser "menos homem" por causa dessas coisas?

Tenho um teste infalível - escolha qualquer uma dessas questões ou qualquer outra que não perguntei e faça-a (use roxo ou rosa-choque, vá dançar balé ou quebrar a munheca, etc). Agora abra a calça e olhe se "seu amigo" continua lá. Ele continua? Então você não deixou de ser homem. Vai testando. Se ele cair por causa de alguma dessas questões, consulte um médico, pois isso não costuma ser normal. Hehe!

Chega a ser curioso e incrível observar o quanto seres de tanta força física teimam tanto em não trabalhar a questão emocional e isso pode ser um ENORME problema. Nesse quesito, as mulheres têm muito mais liberdade de dizer o que sentem, sem tanto medo, mas os homens, por não exercitarem isso, às vezes, nem sabem como fazer ou por onde começar. Muitos nem se sentem a vontade de expôr o que sentem e nem trabalham esses sentimentos. O machismo aprisiona tanto o homem que se ele expressar uma felicidade constante, já acham logo que ele é gay.

Uma vez, participei de um grupo terapêutico da universidade onde estudo e achava que nós mulheres que liderávamos a ida aos psicólogos, mas fiquei chocada em ver tantos homens no grupo e, ainda, de ouvir a psicóloga comentando que tinham muitos homens que se consultavam com ela e que não sabiam o que fazer com tantas cobranças sociais e estereotípicas, nem com seus próprios sentimentos de incapacidade por não seguirem esse padrão que muitos não querem quebrar. Eles as tomam como verdade, as aceitam e são escravos da própria decisão! Toda e qualquer tentativa de liberdade desses parâmetros é visto como uma afronta e alguns são violentamente contra qualquer ideia questionadora.

Aliás, tudo o que o homem teme é ser comparado a alguma característica feminina e eis a reflexão que quero que os homens façam: ter alguma característica mais feminina é tão horrível assim? Ter o seu lado feminino desenvolvido não, necessariamente, significa que você tenha tendências homossexuais (mas também não há nada errado se você tiver) e sim, que você tem mais sensibilidade e um outro olhar a respeito de outras questões e isso pode ser muito positivo. Pensem sobre isso e no dia que vocês não temerem o feminino, vocês estarão livres para ser quem vocês querem ser.


E é isso, galera. O machismo não protege ninguém. Nem os próprios homens. Só nega o direito das mulheres e força os homens a afirmarem sua masculidade. alguém já viu alguma campanha ou slogan do tipo "homens, unidos pelo machismo para não servir o exército"? Ou "machismo roga igualdade de gênero na idade de aposentadoria"? Ou ainda "machismo luta pelos direitos do homem do lar"?

E homens modernos, parabéns pelas mudanças e pela conscientização que vocês estão tendo. Aos pouquinhos, vocês têm quebrado alguns estereótipos, têm se tornado homens melhores e mostrado que vocês são grandes parceiros das mulheres. A crescente onda conservadora tá aí para bagunçar as coisas, mas por favor, reflitam e não deixe que nada perturbe a sua liberdade.

Beijos!

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